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NOSSOS AMIGOS, OS FÃS

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Roberto-Carlos-Pessoal-Anos-70-17HOR

Nossos olhares estão em vocês.
Vocês que que curtem e ouvem Roberto Carlos nos nossos parceiros de streaming (Spotify, Deezer, YouTube, Amazon Music, Apple Music…) que diariamente checam as redes sociais de Roberto Carlos, interagem, escrevem e compartilham o conteúdo, que vão aos shows, que assistem aos Especiais de fim de ano, que compram aquela revista em que ele está na capa, que participam de fã clubes, enfim…
Vocês a quem geralmente chamam de fãs, mas que sabemos fazer parte dos milhões de amigos.

Veja que o tempo pode até passar mas existem coisas que não mudam…
A matéria que transcrevemos abaixo foi publicada em julho de 1971 na Revista Bondinho (distribuída nas lojas Pão de Açúcar) e escrita por Roberto Freire.
As fotos que ilustram a matéria foram tiradas pelo próprio Roberto.
O tema principal aborda a relação entre fãs e seus ídolos.
Nem parece ter sido escrita há tanto tempo, não acham?

ROBERTO CARLOS BRINCALHÃO FAZ CARETAS EXCLUSIVAS E GOZADÍSSIMAS PARA VOCÊ. ELE MESMO SE FOTOGRAFOU, DIANTE DE UM ESPELHO, PARA ESTA REPORTAGEM EM QUE O BONDINHO PUBLICA AS CARTAS DE AMOR QUE CONTAM O QUE É UM ÍDOLO – O MAIOR QUE A CIDADE JÁ TEVE.

`Robertinho querido`,
`Meu amor Roberto Carlos`
`Olá Rob`, `Meu adorado príncipe de ouro`,
`Prezado sr. Roberto`,
`Distinto Roberto Carlos`,
`Meu querido adorado amor`.
(Cartas a um deus de hoje)

Das dezenas de milhares de cartas de seu arquivo, Roberto Carlos cedeu-nos perto de cinco mil, escolhidas ao acaso. Através delas, é possível compreender o fenômeno da idolatria, Ou seja, esta reportagem vai falar do ídolo, e não da pessoa ou do artista Roberto Carlos.

”Meu amor Roberto Carlos,
É com imenso prazer que escrevo-lhe pela primeira vez, para ver se consigo desabafar um pouco deste grande amor que me invade.
Querido eu o amo mais do que tudo na vida, não sei mais onde por tanto amor e paixão por você.
Betinho, as suas fãs aqui são imensas e todas gamadas por você mas com razão pois você é a pessoa mais perfeita do mundo, o garoto mais lindo que meus olhos já viram e também és o possuidor da mais bela voz.
Beto, tenha dó de mim, mande-me uma foto autografada, e se for possível quero uma grande para colocar em um quadro, pois eu não ando suportando mais viver, viver sem uma recordação sua.
Querido, termino esta enviando-lhe um abraço desta que o ama loucamente.”

Em 1965 Roberto Carlos começou a ficar famoso e a atingir um público imenso. Através do programa de televisão Jovem Guarda, e dos discos que vendiam milhares de cópias em poucos dias, passou a representar para a juventude brasileira o que representavam Elvis Presley nos Estados Unidos, Johnny Holliday na França e os Beatles na Inglaterra. Seus shows provocavam incrível histeria nas massas. Logo foi chamado de “Rei” e começou a ganhar fortunas, firmando-se depois como o maior ídolo popular que o Brasil já teve, em todos os tempos, na música. Hoje passador seis anos, seu prestígio e valor como intérprete e compositor continuam os mesmos, mas o período da idolatria parece haver terminado. Como Frank Sinatra nos EUA, ele pode permanecer por mais vinte anos como um símbolo de romantismo moderno na música popular brasileira. Mas, assim como aconteceu com Sinatra, o ídolo, o deus, o culto criado no começo de sua carreira, chegou ao fim. Não é culpa de ninguém, é um aspecto normal do ciclo da idolatria provocado pela juventude em função de características próprias de cada época. No caso de Roberto Carlos, pode-se dizer que seu talento o sustentará por muitos anos, pois hoje são ainda mais belas e maduras suas interpretações e composições.

A análise das cartas do culto Roberto Carlos restringe-se, portanto, ao período áureo de sua carreira: de 1966 a 1969. Comparando nossos números com as estatísticas sobre os ídolos de Hollywood, realizadas por Leo Rosten e Margareth Thorp, temos uma coincidência: 85% das fãs de Roberto Carlos têm menos de 21 anos (há também cartas de crianças de 4 anos e de adultos de 80), 80% são do sexo feminino. Assim, o fanatismo mostra-se um fenômeno tipicamente jovem e feminino. E a extensão deste culto já foi dosada: o número de fãs das populações dos Estados Unidos, França e Inglaterra é de 5 a 6%. Aliás, nos Estados Unidos existe um “Fan Mail Department” (Departamento de Correspondência de Fãs) que mede a popularidade dos artistas através do número de cartas que recebem por semana.

“Procuro imaginar o que você faz neste momento… é este momento: dia 15, sábado, oito e dez da noite”

O que se observa em primeiro lugar, na leitura das cartas é que, por serem divinizados, os ídolos são mais que objeto de admiração. Chega a formar-se em torno deles um esboço de religião. Os fiéis dessa religião são as fãs.

”Imploro-te de joelhos, para você me mandar o seu endereço particular, para nós trocarmos idéias. Por favor! Jogo-me a teus pés se quiseres, mas dê-mo. Seja bonzinho. Ah! Por favor Roberto!”(SP)

“Carlos – nome feito para vencer.
Carlos – nome de reis.
C – Cristo – Rei dos Reis
A – Águia – Rainha das Aves
R – Rosa – Rainha das Flores
L – Leão – Rei dos Animais
O – Ouro – Rei dos Metais
S – Sol – Rei dos Astros

O meu nome não é agradável: Vilma
VIL
MA
Mas eu não sou, não” (PR)

Forçada pela fãs, a vida particular do ídolo torna-se pública e sua vida pública em publicitária. O ídolo participa, assim, de uma função social, começando pelo noticiário dos jornais e revistas, fotos em primeiro plano (discretas ou indiscretas), boatos de toda natureza, reportagens que devassam seu passado e presente e tentam revelar cada detalhe físico e íntimo de sua pessoa. Ele fica fazendo parte diária de seus admiradores. E, mesmo sendo considerado um deus pr eles, não é totalmente inacessível por causa de suas aparições públicas nos palcos, telas, vídeos. Essa aparente “degradação” da divindade do ídolo estimula e multiplica os pontos de contato entre ele e os “mortais”. E, longe de destruir o culto, a humanização parcial, o favorece. Mais presente, mais íntimo, o ídolo está praticamente à disposição de seus admiradores.

”Você usa cabeleira? Olha, Roberto, um conselho: não corte o cabelo, você fica bonito, aliás sempre foi belo.” (PE)

“Como vais? Não esqueça de descansar. Não esbanjes tanto a tua vida, guarda, cuida para que eu possa desfrutar do teu carinho mesmo distante. Já imaginastes se morreres? No nosso Brasil haverá dilúvio de tantas lágrimas…” (RS)

“… enquanto isso vou mandando as letras, faça a música e grave-a. Nesta vão mais letras, olhe Roberto, eu fiz uma letra que será mesmo boa, foi num momento de tristeza que a compus, nas alegrias eu faço letras tristes e nas tristezas faço letras alegres, mora! Esta tem o título “A noiva dos meus sonhos” que foi muito elogiada pelos colegas e que certamente será um estouro.” (RS)

“Posso ir no seu casamento? Você não me nega um convite? Roberto, fiquei tão triste quando disseram que você é noivo. Saiba que eu tinha uma coleção de fotos suas, rasguei-as todas, tive tanta raiva. Não é que eu pense que vou casar-me com você. Ah! Isso não! Mas tive um ciúme louco, pois gosto de você “livre”, bem “livre”, nada de acorrentado.
Espero que este tal noivado, se é que é verdade, que você seja bastante feliz. Se você soubesse o quanto me dói desejar-lhe felicidades ao lado dela” (SP)

“Roberto Carlos: Gostaria muito que viesse passar uns 20 dias ou passar meu aniversário no dia 8 de fevereiro vou fazer 10 anos.Gostaria de saber seu endereço. Mando-lhe um abraço ao seu filho e sua mulher. Obrigada.” (PI)

A religião do fã está fundada no amor. Mas um amor que não pode possuir o objeto amado, tanto no sentido sociológico como psicológico do termo. O ídolo escapa à propriedade particular, então o amor por ele deve ser um amor sem ciúmes, sem inveja, divisível, pouco sexualizado (pelo menos na aparência), como uma adoração. O quadro que se estabelece porém, é o de um amor real – o adorador quer que o adorado seja também adorados, embora aceitando a condição inferior com humildade e se conformando com um mínimo de retribuição através de sinais ou símbolos. Como por exemplo, a resposta às suas cartas. A máquina publicitária alimenta essa retribuição e os fã-clubes a institucionalizam

As cartas realmente servem bem a esse tipo de culto, pois o fiel deseja que seu deus o escute (ler suas palavras, tocar o papel por ele tocado) e responda às declarações de amor, às confissões íntimas, aos pedidos simples ou extravagantes.

”Eu, uma moça de 44 anos, mando-lhe perguntar se é capaz de gravar uma das suas belas gravações em meu benefício, a fim de que eu possa comprar uma casinha (…) (PB)

“Prezado Sr Roberto Carlos:
Como sou também fazendeiro e técnico na criação de gado, porcos e tudo quanto diz respeito a agropecuária, venho propor-lhe um estudo no sentido de invertermos parte de suas rendas em fazendas de criação em Mato Grosso, Goiás ou até mesmo em São Paulo, na Alta Sorocabana. Nos dois primeiros estados os preços são verdadeiramente convidativos. Neste as fazendas já estão quase sempre formadas, sendo as terras mais caras. Poderíamos iniciar com uma fazenda média, prepará-la e, oportunamente, partir para outras, até formar para V. Sra um verdadeiro império agropecuário…”(SP)

“Prezado Senhor,
Cumprimento-os V.S e sua esposa ao ensejo do nascimento do primogênito, desejando-lhes saúde e felicidade. Precisando muitíssimo de um carro, mesmo usado, recorro a V.S., se possível for, conseguir-me um; que ficarei muito antecipadamente agradecido… Enfim espero que solucione esse problema tão angustioso para mim” (MG)

Outra coisa importante das cartas são as exigências para que o ídolo não mude nunca, que apresente qualidades excepcionais (sinceridade absoluta, modéstia, bondade, beleza e compreensão integrais), enfim uma super-humanidade e uma grandeza de espírito sem igual.

”…Sou mãe de três filhas pequenas, meigas, puras, que tem um entusiasmo enorme por você. É por elas que escrevo. Quando as vejo pregadas à televisão, sem mais se importarem com o resto, penso na sua mocidade, e, principalmente, nos Dons que você recebeu. Pensei também, que você só pode ser o reflexo da pureza e bondade dessas crianças. Ama-se, em geral, o belo e o bom, através do que as pessoas são. Como eu admiro os verdadeiros valores! Transmita sempre, a essa mocidade, uma mensagem de alegria sadia, de verdadeira beleza. Sua vida é, por assim dizer, destinada a conduzir os novos – transbordando música, mostre-lhes só o lado grandioso da vida.”(RJ)

Como fiéis, as fãs desejam também consumir sue deus. Consumir, em religião, significa incorporar, assimilar. O fã quer saber tudo (possuir) sobre seu deus e digerir mentalmente sua imagem total, com tremenda avidez. Uma espécie de apropriação mágica.

”Robertinho, nesse momento estou quase na solidão, ouvindo músicas suas para o consolo, lendo uma revista narrando sua vida e olhando algumas fotos suas. Procuro imaginar o que você faz neste momento, talvez em algum programa. Será? … é esse o momento: dia 15, sábado, 8:10 h (noite)” (ES)

“Não o conheço pessoalmente, infelizmente. E por que? Castigo… Eu o amo! Penso em você o dia inteiro. E por castigo não consigo nem sonhar com você” Só assim: você está no seu apartamento e eu o chamo, grito, mas inútil, você não aparece! Não é castigo? Chego a rezar para sonhar com você, mas nada” (BA)

É a hora das máquinas publicitárias que, na promoção dos artistas, utilizam boatos e indiscrições sobre suas vidas, procurando aumentar sempre sua popularidade e, consequentemente, o apetite e o consumo das fãs. Algumas dessas fãs, em suas fantasias, propõem encontros para atos afetivos e sexuais de forma indireta ou francamente direta.

”Roberto, ainda não desisti de marcar um encontro com você, esta é a sexta vez que lhe escrevo inutilmente, mas ainda insisto, e te esperarei segunda-feira às 4 horas da tarde, em frente à casa que o Agnaldo Rayol comprou no Brooklin, é a 4ª travessa depois do balão do bonde nº 274. Esperarei todas as segundas-feiras no mesmo lugar. Venha ao meu encontro, não precisa ter medo pois sou maior de idade, simples, estarei sozinha à tua espera.” (SP)

“Estamos morando tão perto e não sabemos, ou melhor, você não sabe. Mas você pode me localizar:
1) Colocando sua suave cabecinha para fora da janela de sua sala, você olhará para esquerda
2) Acompanhe com o olhar até o fim da quadra até chegar na esquina onde há duas sorveterias. Certo?
3) Atravesse a avenida. Do lado de cá da avenida olhe para a calçada oposta a calçada do seu prédio.
4) Logo você vai ver dois prédios: o de cinco andares não é o meu. Ao lado é o de seis andares, de pastilhas: é esse!
Suba até o 5º andar. Tem dois apartamentos por andar, o meu é o primeiro, logo você verá em primeiro plano” (SP)

“Olá Rob,
Tudo bem com você? Desejo que sim. Você deve andar muito cansado ultimamente não? É por isso que lhe escrevo. Tenho um iate, isto é, não sei se o termo é bem” iate”; pois não é tão grande assim. Na popa tem um quarto com duas camas, armários e um toilette conjugado. No meio entre a sala de refeições e esse quarto, há uma sala do leme, onde também dorme o marinheiro. Na sala de refeições há três camas, mesa, geladeira e fogão que são embutidos. Há, na proa, mais uma cabina, onde se encontram duas camas beliches e um banheiro, menos, também conjugado. Até que é bonzinho né?
Gostaria de convida-lo para passar uns dias no barco. Como ele fica em Angra dos Reis, vamos com nosso avião. Sempre vou com meus pais e irmãos durante o fim de semana mas como você tem Jovem Guarda domingo, podemos ir durante a semana.Imagine-se em alto-mar, num iate, tomando drinks e apreciando a lindíssima paisagem que Angra oferece. Apreciar aquela água tão azul, tão cristalina… E o pôr do sol? Você nem pode imaginar. É a coisa mais linda que existe. Não só o pôr do sol, como as estrelas, enfim, a noite em geral. Tudo maravilhoso. Durante a noite, o meu passatempo, enquanto todos conversam na proa, é ficar sonhando acordada enquanto aprecio estrelas, lá na popa…É pena que não possa por o nome do barco, nem mais detalhes, mas é que se minhas amigas souberem, vai ser uma badalação sem fim, pra irem também. Mas eu não quero ouvir nem levar ninguém… Conforme a resposta que dará a este convite, escrevo-lhe outra carta dizendo como se comunicar e marcar o dia. Arranje ao menos dois dias, pois, afinal, trata-se de tratar um pouco da saúde! E esse descanso lhe fará muito bem, muito melhor que descansar em seu apartamento com os berros e telefonemas dos fãs.”(GB)

`Se meu amor não for correspondido, juro a você como vou para um convento de onde só sairei morta.`

“Eu não sou uma adolescente. E nunca pensei em você, é, sei quem é você e é óbvio que já ouvi e vi você cantar. Mas tudo atrás de algo que chama “ídolo”. Aquele tal que falo como “ídolo” se veste como “ídolo”, se apresenta como “ídolo”, o autêntico “ídolo”. Este não é o meu tipo. Agora, juro que gostaria de conhecer o Roberto Carlos Braga “gente”. Gosto do seu sorriso. Acho-o tão inocente. Inocente, porém, só o “sorriso”, pois tenho certeza que suas mãos sabem acariciar muito bem um corpo de mulher”. (SP)

O culto a artistas como Roberto Carlos geralmente é espontâneo e ingênuo. Por isso vira fetichismo. Fetiche é o objeto ou coisa ao qual se atribui poder sobrenatural. Sentindo a impossibilidade de realização plena e direta de seu amor, o fiel (a fã) se satisfaz com um fragmento, um objeto, um símbolo da pessoa amada, na falta de sua presença real.

“Roberto peço-lhe, por favor, me mandar um pedaço de sua camisa ou lenço ou calça como lembrança”. (CE)

“Gosto muito de você, sei que isto não é novidade para você, mainha e painho disseram que você é fabuloso e é mesmo. Eu me esqueci de mandar pedir um pedaço dos seus cabelos e um pedaço de sua roupa, mas mande mesmo Robertinho. Não aguento ouvir você cantar “Esqueça”. Betinho, você é um amor. Agradece, com mil beijos e mil abraços sua …” (BA)

Certos dados físicos como peso, altura, prato favorito, por exemplo, já respondem a essa necessidade de conhecimento fetichista. A mesma necessidade se fixa sobre as fotografias, presenças-fetiches universais do século XX. A foto é a melhor representação da pessoa real. Com as pequenas fotografias coloridas nos bolsos ou os enormes cartazes nas paredes de seus quartos, as fãs podem contemplar e adorar seus ídolos. 90% das cartas dirigidas a Roberto Carlos pedem fotografias. Algumas fãs confessam possuir centenas delas e ainda podem mais. O autógrafo completa o tipo de fetiche das cartas, mas há várias outros tipos.
Em 1939, um artista de Hollyood recebeu os seguintes, entre milhares de pedidos: sabonete usado após o banho, colher usada, um chiclete mastigado por ele, mechas de cabelo, meias, lenços, a frase “I love you” escrita 825 vezes, cuecas autografadas, e até oferta de tomar o lugar do cão de estimação do artista.
A falta de retribuição real ao seu amor e a incapacidade de aceitar o fetiche leva certas fãs fortemente neurotizadas pela divinização a ameaçar seus ídolos com sacrifícios masoquistas, caso não sejam correspondido. São muitas as cartas a Roberto Carlos com a ameaça mesmo de suicídio.

“Roberto Carlos
Quando estiveres lendo estas linhas, alguém aqui tão longe estará chorando; este alguém sou eu. Choro porque estou apaixonada por você. Roberto, minha vida de uns dois anos pra cá tem sido um inferno. Dois intermináveis anos que me tem feito sofrer muito. Já não tenho mais esperança de esquece-lo, é tudo inútil o esforço que eu faço. Não aguento mais esta vida, sinto dia a dia que as forças me abandonam. O mundo tem sido mau para comigo. Por que eu tenho de sofrer tanto? Por que tive de me apaixonar justamente por você? Oh! Deus, como é triste viver assim… E tudo o que estou passando é por você, Roberto. Eu o amo! Amo-o com todas as forças do meu coração, e por isso vivo neste tormento, pois sei que o meu amor é impossível. Ajude-me Roberto, em preciso tanto de ajuda, ajude-me, eu suplico. Preciso encontrar uma solução, ou acabarei ficando louca. Sei que você não tem culpa, e que, portanto nada pode fazer por mim. Mas peço-lhe, não ria deste sentimento que eu tenho por você. Quando estiveres ouvindo sua própria voz em “Não quero ver você triste”, lembre-se de mim, por favor, lembre-se de que naquele momento eu também estarei pensando em você. Sim, pois você está sempre no meu pensamento. Roberto, quem sabe um dia eu terei forças para acabar com este sofrimento. Para que viver. Se meus dias são uma tortura contínua, se não posso nem ao menos sonhar com você! Sinceramente da vida nada mais espero, e creio que a solução possível seria dar um fim em tudo. Eu vou lhe escrever outras cartas Roberto, com este papel azul para que você reconheça, mas quando as mesmas cessarem, é porque finalmente eu terei encontrado a paz de que tanto necessito. Sem mais se despede esta que o amará te o fim dos seus dias.” (SC)

“Meu adorado príncipe de ouro. Meu amor, ao iniciar essa, meu maior desejo é que o encontre em perfeita saúde e felicidades. Roberto eu te adoro meu amor, para mim só existe você no mundo. Quando penso que o amo, e que meu amor jamais poderá ser correspondido, eu tenho vontade louca de me atirar de um viaduto. Mas se eu não fizer isso, eu juro a você como irei para um convento do qual eu só sairei quando estiver morta…” (SP)

Quando Rodolfo Valentino morreu, duas mulheres suicidaram-se diante do hospital onde estava o corpo de ator. Era-lhes insuportável a perda do deus amado.
O fetiche é usado também de forma inversa – as auto descrições físicas, fotos, os mais variados e estranhos objetos pessoais. No apogeu de sua fama, a atriz de cinema norte-americana Norma Shearer recebeu pedaços da pelo do corpo de um de seus adoradores.
O fã age também como certos povos primitivos em relação aos deuses que não atendiam seus votos. Fazem críticas severas à falta de atenção do ídolo a seus pedidos. No fundo, esse tipo de agressividade encobre o amor. Mas em sua forma chantagista.

“Cuidado Roberto com o que você fala e como trata as suas fãs. Se elas lhe telefonam é com boa intenção, porque o adoram, nunca para importuna-lo. Você não quer ser procurado, querido? Isto o aborrece? Pois daqui a algum tempo você verá o que lhe pode acontecer. Não será, talvez mesmo, procurado por ninguém mais. Será esquecido!” (GB)

“Querido Roberto:
Desejo-lhe antes de tudo saúde e boa sorte. Não devia mais escrever a você, pois esta já deve ser a centésima carta, e NUNCA ouvi você ter a gentileza de acusar o recebimento… Acho até, sem exagerar, que a minha caligrafia já lhe deve ser bem familiar, tal são as inúmeras cartas que já lhe escrevi; para lhe dar um exemplo de sua descortesia vou fazer-lhe uma pequena comparação, entre um artista americano, e um artista brasileiro. O brasileiro, no caso específico, é você. Há 15 dias escrevi para o Elvis Presley, pedindo uma foto: fui atendida imediatamente, recebi uma belíssima fotografia 18×24, e mui gentilmente, sensibilizado com a deficiência que tive para com ele, fez-me dois pedidos: a minha amizade, e que lhe mandasse também uma foto com a mesma brevidade. Fiquei estupefata ao receber essa carta, pois esperava apenas o retrato; ao lê-la, fiquei pasmada; assombrada; e atônita, com a elegância com que acatou a minha amizade, sugerindo assim um intercâmbio melhor… Talvez, um dia, as minhas cartas venham a ter melhor sorte em suas mãos, quem sabe? Vou esperar você descer alguns degraus, desse pedestal, do qual você se sente intocável. Não se sinta tão inatingível, tão alto, senão você vai acabar chegando à lua antes que os astronautas… Será que você não é louco, rapaz? Se continuar indiferente não faz mal, você sabe bem o que faz.” (SP)

Um dos traços fundamentais do culto aos ídolos é o processo de identificação. A identificação pode ser amorosa quando se trata de artista de sexo oposto; ou acontece na forma de valorização daquilo que em psicologia chama-se de alterego, ou seja, um outro eu, um “eu” ideal que existe em cada um de nós e que podemos encarnar por heróis e ídolos. Essa magia de identificação funciona de forma totalmente onírica, como se fosse um sonho, ou de maneira onírico-prática: o fã imita consciente e inconscientemente o amado.
O que determina a identificação do admirador pelo artista não é apenas o talento, a beleza, as qualidades morais, nem mesmo a máquina publicitária que mantém o artista em evidência, mas principalmente a necessidade de criar um ídolo. Necessidade devida à própria miséria da insatisfação pessoal, à solidão, à vida morna e anônima que o fã gostaria de elevar às dimensões da vida artística. O ídolo significa a projeção dessa necessidade.

“Roberto Carlos: meu amor é Aristides, mas devido a que todos acham que pareço com você, então tenho o pseudônimo de Segundo Roberto Carlos. Você não acha ruim de seu fã ter este pseudônimo? Sou cantor amador, participo de vários programas de calouros, tanto em rádio, tanto em TV, mas nunca cantei nem dublei música de outros artistas, só sei cantar e dublar as suas músicas. Já levei uma buzinada no programa do Chacrinha, dublando o “Quero que vá tudo pro inferno.” (SP)

Nota da redação: Um dos grandes personagens da cidade, Roberto Carlos teria que ser capa do Bondinho, mais dia, menos dia. Mas, depois de tanta coisa que já se fez com ele, como escrever coisa nova a seu respeito, e como fotografá-lo de algum jeito ou ângulo novo?
As fotografias foram feitas por ele mesmo, diante de um espelho, em sua casa do Morumbi.
E as cartas da reportagem são publicadas pela primeira vez.

 

Notas do Site Oficial RC:
O texto acima é uma transcrição e pode estar em desacordo com o atual acordo ortográfico da língua portuguesa.Achamos a matéria bem interessante, mas não necessariamente concordamos com tudo que foi dito.
Consideramos o contato entre o fã e o artista importantíssimo.